Sonhos que nos definem
Hoje cedo eu vi um post de Facebook na página “Pseudo
Cinéfilos” falando que “somos feitos de 95% dos filmes que assistimos”. Achei
curioso e compartilhei, embora não saiba bem a procedência dessa porcentagem,
que parece mais coisa de aficionado. Mas o conceito em si fez muito sentido pra
mim, que sempre me questionei pra onde vai aquela torrente de informação que a
gente apreende quando vê um filme ou lê um livro. Certamente, há filmes que são capazes de
modificar o nosso modo de ver o mundo, que moldam nossa personalidade ou se
tornam hinos de momentos memoráveis de nossa vida.
No meu perfil do Filmow
eu separei alguns filmes favoritos que preenchem bem essa categoria de moldes
para a vida, histórias de formação. Um exemplo forte é Brilho
Eterno de uma Mente sem Lembranças (2004), que se encaixa na esfera dos “filmes
queridos”, porque simboliza parte da minha personalidade, uma época da minha
vida que se comportou tal qual o enredo complicado do filme de Michel Gondry e
Charlie Kaufman. Sua mensagem, assim que assisti ao filme, fixou-se fortemente
em mim, mas com o passar dos anos o romance entre Joel e Clementine se encheu
de significado e tornou aqueles episódios cada vez mais claros, porque também é
essa uma função da arte: explicar a vida.
Outro filme romântico poderosíssimo em minha vida foi Her (2014), de Spike Jonze. Lembro que
descobri esse filme sozinho, naquela lista de indicados ao Oscar, e isso me
deixou um pouco vaidoso, por gostar e descobrir um filme tão brilhante, com sua
metáfora vanguardista para amores líquidos. Não sei se foram os filmes que me
tornaram uma pessoa complicada ou se eu sempre fui assim. Mas o fato é que
esses enredos emprestam complexidade ao meu dia-a-dia, dão colorido ao que
antes era opaco e intransponível.
E, com o tempo, você passa a se especializar, a buscar
filmes mais complexos ou filmes que tenham uma densidade compatível com sua
sensibilidade, com o seu repertório. Foi assim que Mr. Nobody (2009) entrou para a minha lista de favoritos, porque
ele ilustra bem essa coisa enigmática que a gente busca nas artes. Vicky Cristina Barcelona (2008) é uma
fábula de paixões e aventuras que me parecia muito com essa vitalidade
imprevisível que eu experimento agora, ainda jovem. Amour (2012) e Cachè (2005),
de Michael Haneke, e Dogville (2003), de Lars von Trier, são obras de arte que me fizeram entender um pouco mais a
alma humana e, de forma um tanto obscura, desvelaram algo do que todos nós
somos capazes. Obviamente me trouxeram uma dose de ceticismo e lucidez difícil
de obter sem a ajuda do cinema e a sua competência imagética.
O fato é que há ideias que só o cinema pode passar. E nós
procuramos por isso, mesmo que inconscientemente. Lendo o filósofo Alain de
Botton, entendi que a arte tem um poder precioso de curar nossas patologias, de
nos aperfeiçoar enquanto seremos humanos. E nesse momento tão crítico em que
põem a arte na berlinda, é imperativo lembrar que arte serve pra emocionar e
pra fazer refletir, para nos aliviar do tédio que é a existência – pelo menos pra
mim, que sou secularista. A arte tem o poder de dar cor à vida, sem qualquer
paralelo, porque é capaz de nos agradar em qualquer de suas linguagens: cinema,
música, artes plásticas, literatura, etc. E o cinema tem o seu charme peculiar.
Há filmes, como o recente Mad Max (2015),
de George Miller, que sintetizam o que é o cinema, a sua capacidade imaginativa
de nos transportar para os sonhos. E os sonhos nos definem enquanto pessoas.
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